Regina Célia é escritora, formada em Letras, membro da AMULMIG _ Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, autora dos Livros Gangorra e Ad versos, alem de crônicas publicadas em jornais e em posts.

sábado, 4 de junho de 2011

Ensaio sobre a lucidez*



A loucura é sedutora, faceira, abrasadora... Os loucos são felizes e têm a louca consciência de que o são, por isso se calam.

Não há, deveras algo mais comunicativo e filosófico que o silêncio dos loucos. Talvez escutem os murmúrios que a sanidade impede aos normais escutarem, talvez tenham o espírito embriagado nos poemas mais líricos e não se atrevem a macular a sonora afonia dos versos declamados. Os anjos o fazem e interrompê-los é pecado dos mais graves.

A loucura é sedutora, faceira, abrasadora... Os bêbados não são loucos mas buscam atormentar a mente a fim de se libertarem da loucura que é viver sóbrio. Os loucos são felizes, mas os bêbados não são e têm a louca consciência da sua infelicidade, por isso falam. Falam muito, falam alto, às vezes, baixo. É incrível como a loucura programada desata os nós da língua. Alguns, de tanto desejar, até chegam a incorporá-la, entretanto, com um agravante: falam demais.

A loucura é amiga do silêncio e dos pensamentos solitários. Desconfie dos loucos falantes. Estes não são loucos! Louco falante é o projeto do homem feliz que poderia ter sido e não foi por força da absoluta ausência de critérios na distribuição da loucura. Um pouco de loucos todos temos, mas um pouco, às vezes tão pouco que não nos permitimos enxergar sua existência . Daí, saímos por aí a falar, a beber e a filosofar numa indubitável verborragia sonora.

Os loucos, de fato loucos, incomodam mais pelo silêncio que pela falácia. Incomodam e não invejam a normalidade ensandecida dos não- loucos, enquanto estes, infelizes que são, tentam a todo custo isolar seus dessemelhantes porque são felizes.

E enquanto não nos acorrentam ao estereótipo de loucos e nos martirizamos com a expressão "isso é loucura" a cada exíguo momento feliz, este ensaio visa a propositura de uma trégua à vigília, estendendo à avidez dos desejos um convite e um brinde à felicidade. À nossa!

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*Texto recuperado. Escrito e publicado por mim em algum lugar e tempo passados. Atualizado para o blog.

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