Velhos costumes, velhas manias,
manias de velhos... Isso é comum em cidades do interior. Na minha cidade era
comum! Uma cidade pequena, incrustada num vale mineiro entre as Serras do
Espinhaço.
O solo de minério de ferro e
ouro, pouco propenso ao cultivo agrícola, mas de forte apelo minerador atraiu,
desde a sua fundação, os olhares ávidos de enriquecimento das grandes empresas.
A cidade que era pacata e ordeira
fervilha em uniformes variados, em rostos desconhecidos, em sotaques típicos de
terras distantes...
Os velhos costumes deram vez aos
modismos e à modernidade. As ruas de casas baixas vão cedendo às construções
verticais que também tomaram conta dos quintais. Já não há mais pomares,
gangorras, forno de barro para assar quitandas...
Trapoeirabas, aguapés, lixo e
esgoto se acumulam no Córrego São Miguel e no rio são João, cujas poucas águas escoam
em pequeno leito lodado e deixam para trás o mau cheiro e a vã ilusão de vida.
As noites, outrora perfumadas de
madressilvas e damas da noite, outrora salpicadas de estrelas, outrora
embaladas por violões e serenatas não mais comportam contemplações e o silêncio
dos que dormem é substituído por roncos de motores e sons automotivos.
Ainda outro dia, em conversa com
Patrícia Fernandes, dizia-me ela sobre o desrespeito dos motoristas na velha
rua Dr. Moura Monteiro. Lá, os velhos e seus velhos costumes de se deitarem
cedo são aterrorizados pelos carros e seus funks horrorosos que perturbam até a
surdez da terceira idade, são ameaçados pelos “pegas” e “rachas” noturnos,
que a qualquer momento podem vitimar os
moradores dentro da própria casa.
Quem são esses seres assustadores
que roubam a paz dos velhinhos? São filhos de quem? Filhos de onde? Teriam
porventura, pais e avós? Por que a
policia não coíbe tais transgressões?Que mecanismos podem ser acionados para
que a segurança e os direitos dos cidadãos sejam garantidos?
Já questionei, em outra ocasião,
porque esses santos não se dispõem a perturbar a paz do prefeito, dos
vereadores, do juiz de direito, do promotor de justiça e do delegado... Seriam
tais autoridades imunes à perturbação da tranqüilidade?
Se já não podemos, em nome do
progresso, contemplar as noites estreladas, comer fruta no pé, ter quintais com
pomares e gangorras, tomar banho de rio ou roncar a barriga ao cheiro de biscoitos de polvilho assando
em fornos de barro, que tenhamos pelo
menos o direito de estar serenos dentro de casa, cada qual à sua maneira, como
melhor lhe aprouver.
Não é nostalgia nem é xenofobia,
mas quero envelhecer na minha cidade do interior, resguardando, pelo menos, o
direito de dormir, o direito de ouvir apenas a música que eu quiser ouvir e
quero ainda o direito de pedir a bênção, por muitos anos, aos que vieram antes
de mim!Quero direito aos velhos costumes.